O que é desvio de função e o que fazer quando acontece.

O momento econômico que o Brasil enfrenta tem proporcionado falência de grandes empresas e demissões em massa, sob a justificativa de que estão passando por dificuldades financeiras e que precisam reduzir o custo com pessoal. Acontece que determinados meios corporativos funcionam pela união do serviço de cada funcionário e, quando alguém é demitido, aquela função precisa ser preenchida para que o rendimento da empresa não fique comprometido.

Se as demissões ocorrem para evitar gastos com empregados, certamente o empregador não está disposto a fazer novas contratações. Neste momento, surge uma prática não permitida por lei mas muito comum nos diversos ambientes de trabalho pelo Brasil: o desvio de função.

O denominado desvio de função ocorre quando o funcionário é contratado para prestar determinado tipo de serviço mas, por algum motivo, acaba sendo coagido a exercer outras atividades, sem receber qualquer adicional em seu salário para isso.

Este tema é bastante controverso e a Justiça ainda não possui orientações consolidadas a respeito. Por isso, em caso de ação judicial para reaver direitos quando há desvio de função, mesmo que ele realmente exista do ponto de vista do trabalhador, o juiz pode entender de forma adversa e acabar não concedendo as diferenças salariais que são devidas ao funcionário.

Neste post você irá aprender mais sobre:

  • Diferença entre acúmulo e desvio de função
  • É possível aumentar o salário por desvio de função?
  • O direito do trabalhador
  • O que fazer quando o desvio de função acontecer
  • Como provar o desvio de função
  • Indenização por acúmulo ou desvio de função
  • Importante saber
  • Conclusão

Diferença entre acúmulo e desvio de função

É importante diferenciar esses dois institutos, muito embora na prática não seja difícil de confundir.

O acúmulo de função é aquele em que o trabalhador acumula com a função para a qual foi contratada alguma outra atividade que pertença a um cargo diferente. É muito comum acontecer quando a empresa faz corte de pessoal e os que ficam passam “quebrar galhos” e exercer as funções que anteriormente pertenciam a outros funcionários.

Por outro lado, o desvio de função é caracterizado quando o trabalhador é contratado para exercer determinada atividade mas é obrigado a cumprir tarefas distintas daquelas especificadas em contrato.É, por exemplo, uma pessoa contratada para ser recepcionista mas que cuida da parte financeira do escritório; teoricamente, o cargo de analista financeiro possui salário maior e requer conhecimento mais específico, mas a que foi contratada como recepcionista continuará recebendo vencimentos como se recepcionista fosse, mesmo tendo volume de trabalho maior e diferente daquele descrito no contrato.

É possível aumentar o salário?

Todo cargo ou função é remunerado de acordo com a quantidade de trabalho e suas demais peculiaridades. Para isso, as atividades que serão exercidas pelo empregado devem vir descritas no contrato e, se houver desvio de função ou se a ele forem atribuídas atividades diversas daquelas para a qual ele foi contratado ou, ainda, se houver acúmulo de funções, o empregador deverá arcar com a diferença no montante salarial e fazer a devida anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social, caso o outro salário seja maior.

Importante lembrar que o salário é irredutível. Isso quer dizer que nos casos de acúmulo ou desvio de função, as diferenças de salário devem ser percebidas quando a atividade extra for melhor remunerada pela empresa, não podendo o empregador diminuir o salário de seu funcionário para aquele contrato específico.

Também não é possível que o empregado receba dois salários ao mesmo tempo: ele será remunerado pela diferença de salário no período em que exerceu funções além daquelas previstas no contrato. Um auxiliar de serviços gerais, por exemplo, contratado para ganhar um salário mínimo por mês e que, além das suas funções habituais, atendia telefone, recebia clientes e anotava recados, deverá receber o que lhe é devido pela função que consta na sua CTPS mais o valor da diferença que seria a do seu salário para o de um secretário.

Desta forma, cada salário deve estar de acordo com o que a função exige, em se tratando de perfeição técnica e/ou intelectual, e também com o piso definido pelo sindicato da categoria.

O direito do trabalhador

Como visto, no contrato de trabalho deve constar as atividades a serem exercidas de acordo com o cargo para o qual o trabalhador foi contratado. Qualquer tarefa além destas poderá caracterizar desvio de função, desde que não haja acordo ou anuência do trabalhador.
A promoção do empregado ou a alteração “vertical” do contrato de trabalho também se enquadra, visto que a partir deste momento o empregado alcançará um nível a mais na empresa, hierarquicamente falando, vai exercer funções diferentes e, na maioria dos casos, vai ter um aumento de salário.

Além dessa, existe a alteração “horizontal”, que é quando o empregado é deslocado de função, passa a prestar outro tipo de serviço mas permanece no mesmo nível hierárquico. Vale lembrar que esta precisa ter uma justificativa condizente e que não acarrete prejuízos no salário do empregador.

Há quatro situações em que essas alterações não são permitidas:

  • Quando a alteração resultar em rigor excessivo;
  • Se colocar em risco a saúde do trabalhador;
  • Se expor o trabalhador à condições humilhantes ou não coniventes aos bons costumes;
  • Se desfigurar completamente a qualificação do trabalhador.

O que fazer quando isso acontecer?

Se foi constatado que as atividades exercidas não condizem com o cargo para o qual o funcionário foi contratado, primeiramente o mesmo deve permanecer em silêncio e não sair divulgando sua intenção de acionar a justiça para questionar o desvio de função. Tentar um acordo com o empregador também é uma boa opção, pois pode acontecer do mesmo não possuir uma assessoria jurídica adequada e desconhecer a ilegalidade do fato.

Pode acontecer, também, do empregador negligenciar e agir de má fé, quando ele sabe das implicações de determinar ao empregado que exerça atividades além das habituais para a sua função e mesmo assim insiste em fazê-lo. Em alguns casos, se o empregado tenta contornar a situação ou se recusa a cumprir tais serviços, o empregador pode considerar esse comportamento como má vontade de trabalhar e resultar em demissão sem justa causa.

Enquanto isso, é importante ir colhendo provas através de vídeos, áudios, documentos e também por meio de testemunhas. E se não há uma compreensão exata a respeito dos direitos do trabalhador em caso de desvio ou acúmulo de função e para garantir o emprego, é aconselhável buscar o auxílio de um advogado ou do sindicato da categoria.

Como provar o desvio de função?

Para requerer os valores devidos em caso de desvio ou acúmulo de função, será necessário acionar a justiça e apresentar no processo provas que evidenciem que o funcionário exerceu atividade além daquela prevista em seu contrato. O responsável por reunir essas provas será o empregado, e ele deverá levar em Juízo os documentos e as testemunhas indispensáveis para o êxito da ação, já que nem sempre é fácil fazer constar e convencer o julgador de que houve verdadeiramente desvio de função.

Indenização por acúmulo ou desvio de função

É fácil reconhecer a ilicitude desta prática, pois ela acontece mediante vontade única do empregador e acarreta em prejuízos diretos ao empregado, principalmente em relação ao montante de serviços e o salário não condizente com os mesmos. Portanto, ao assumir atividades além das que já eram exercidas, o empregado estará sofrendo do empregador o abuso de direito tratado no Código Civil.

A caracterização do desvio de função na Justiça do Trabalho não é simples porque, muito embora esteja prevista na legislação, sua subjetividade gera decisões divergentes nos Tribunais,que nem sempre garante ao trabalhador o recebimento da indenização. Porém, devidamente instruída e munida de provas suficientes para provar o desvio de função, a ação poderá resultar em êxito para o trabalhador, devendo o empregador arcar com o respectivo recebimento da diferença salarial e eventual indenização por danos morais oriundos do assédio sofrido.

A questão também encontra obstáculos quando a função principal do trabalhador permite a execução de atividades acessórias, que não podem ser consideradas como desvio. Tarefas como atender telefone, anotar recados e fazer serviços de banco podem ser exercidas por secretárias, por exemplo, sem a devida caracterização do desvio de função, pois este é um cargo que abrange uma série de atividades correlacionadas.

Desta forma, a indenização cumulada com o pedido de diferença salarial encontra amparo na legislação e permite ao julgador prestar justiça sem a penosa justificativa de que o pedido não é acolhido pelos textos legais vigentes.

Importante saber

O empregador não pode exigir do empregado que ele cumpra tarefas além daquelas para a qual ele foi contratado. Porém, algumas atividades inerentes da natureza do cargo podem ser realizadas sem que seja considerado desvio de função, como por exemplo o motoqueiro contratado para fazer entregas mas que eventualmente precisa fazer cobranças, já que ele é quem vai fazer contato direto com o cliente.
Por isso, nem tudo pode ser levado tão ao pé da letra e o empregado deve saber que algumas tarefas, ainda que não pareçam, estão de alguma forma interligadas a determinados tipos de cargos. E se restar alguma dúvida, o ideal é procurar auxílio jurídico de um advogado especializado em Direito do Trabalho.

Conclusão

Muitas pessoas dependem de seus empregos e dos salários que ganham, por isso, em alguma situação em que possa ser caracterizado desvio de função, o mesmo não discute ou nega ao empregador a possibilidade de cumprir tal tarefa, principalmente pela possibilidade de ser demitido e se ver impossibilitado de prover o próprio sustento e de sua família.

Nestes casos, sabendo da fragilidade do empregado na relação de trabalho, a justiça garante o mandado de segurança para proteger o mesmo sem que ele perca seu emprego, além de ser possível garantir, por meio de ação judicial, a indenização por danos morais em decorrência do assédio experimentado.

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